28 de janeiro de 2011

Infância Roubada.

As memórias remetem para um tempo perdido algures no que fui e no que sou hoje...
A primeira lembrança é a do chorar...
Ver-me sozinho,
pequeno num mundo de gigantes...
Lembro-me de cedo a sombra preencher-me tal como eu preenchia o silêncio gritando constantemente...
Não lembro faces mas um rosto sempre me assombrou...
O rosto de uma linda menina que constantemente sorri para mim e me perturba...
Ela aparece sobre uma face desfocada,
parece correr a minha volta,
oiço o seu riso murmurando...
Vejo-me numa casa antiga como o tempo,
nela bonecas são lembranças de outros anteriores a mim...
Lembro uma velha escada cujo fundo era negro,
a voz murmurante dizia-me para descer mas...
O medo surgia e suspendia-me face ao abismo de gigantes...
Lembro-me de correr até uns braços e sentir aquele calor frio da porcelana...
A porta abria-se várias vezes mas nunca podia sair, pois o mundo lá fora me magoaria...
Ás vezes olhava do topo da janela vendo outros como eu brincando da mesma maneira que hoje faço ao imaginar mundos atrás de mundos...
Entre eles essa menina de face desfocada dizia adeus para mim...
Os dias passavam e a solidão instalava-se, brincando sozinho comigo mesmo...
Como se fosse uma marioneta de mim mesmo...
Sentia que era um boneco animado de vida cujo sorrir não acontecia,
apenas gritavam para mim,
e eu ria constantemente...
As palavras começavam a magoar-me pois a rejeição ao mundo humano tinha-se instalado como um vírus mortal que ainda hoje me impede de ser humano...
Crescia assim o pequeno anjo inanimado tendo como amiga uma menina de face desfocada cujo sorriso ainda hoje me comove...
As aventuras eram mil,
era como saltar de sombra em sombra sempre rindo a cada paço que nos magoavam...
A mágoa desses dias reflecte-se no meu olhar pintado de negro,
as memórias dessa infância silenciosa residem no porquê do anjo ter virado demónio... No meu coração e no meu imaginário essa infância silenciosa repete-se constantemente e a face da menina já não desfocada e é no seu rosto que me inspiro na criação do meu legado de silêncio...
Um belo silêncio carregado de sentimentos e solidão...
Um silêncio doentio onde o riso da menina se funde nos meus gritos dando origem ao meu mundo de bonecas: Silencia...




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